O texto a seguir ao mesmo tempo que fala bem da instituição Museu, faz tambem uma critica ao modelo empregado na maioria das instituiçoes do Brasil que ate agora nao se atentaram para a importancia que o local tem aos seu publico, pois geralmente nao cuidamos ou valorizamos as instituições educadoras, apenas as criamos e nao a mantemos alem de nao acompanharmos suas evoluçoes... Enfim, é preciso ler para entender.
Museu faz bem à saúde
Ao contrário de um tempo em que museu era sinônimo de coisa velha e empoeirada, os museus do século XXI querem ser espaços de discussão, criatividade e pensamento crítico. São fóruns dinâmicos, e não caixinhas de joias. São relevantes para a vida real do público que o frequenta porque o ajudam a lidar com ela. Abrem diálogo com imigrantes, drogados, marginalizados. Constroem exposições e projetos em conjunto com adultos, crianças e idosos, leigos e doutores.
"Museu faz bem à saúde". Esta afirmação, cada vez mais repetida por profissionais de museus, pesquisadores e acadêmicos no mundo todo, ainda pega muitas pessoas desprevenidas, inclusive no Brasil. No início deste ano, no Rio de Janeiro, vivenciei dois exemplos de como nós ainda não nos convencemos do poder benéfico que o museu pode ter na saúde e no bem-estar do ser humano.
O primeiro foi de natureza pessoal. Comemorando o ano novo, aderi à provocação de uma campanha no Twitter que incitava as pessoas a visitarem um museu novo, logo após o réveillon. Certo, eu trapaceei: o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM) não era exatamente novo para mim, pois foi lá que comecei minha carreira, há mais tempo do que me interessa confessar. Mas fazia tempo que não ia até lá, e havia uma exposição que interessava à família toda. Fomos.
Não bastasse o espetacular projeto arquitetônico de Eduardo Affonso Reidi, em meio a um parque planejado por Lina Bo Bardi com jardins de Burle Marx, o MAM possui um acervo igualmente grandioso, ao qual se junta a Coleção Gilberto Chateaubriand (cedida em comodato ao museu desde 1993), uma das melhores seleções de arte moderna e contemporânea brasileira. Para esta museóloga de alma modernista, tudo isso já seria garantia de um ótimo domingo. Não foi.
A visita nos lembrou o castelo da Bela Adormecida, um reino perfeitamente próspero e funcional que, de repente, para no tempo. Os jardins e espelhos d’água estavam descuidados, sem corte, sem poda e com lixo.
- O estado do balcão de madeira logo à entrada do Café do MAM (foto: Claudia Porto)
À entrada do museu, nem mesmo um "bom dia". Tudo o que ouvimos, ao encostar o código de barras do bilhete no leitor digital da catraca, foi um "pode passar direto, não está funcionando". "Vivemos ", pensei, "na terra em que os equipamentos são instalados mas não se planeja a sua manutenção no longo prazo".
O castelo adormecido ficou ainda mais palpável quando subimos para o segundo andar e percorremos as exposições. O MAM costuma ter uma programação de qualidade irretocável; o que precisa ser urgentemente repensado é o modo como esse conteúdo é tratado.
Uma das coisas que mais incomoda no MAM é a falta de qualquer oportunidade de nos aprofundarmos em um determinado assunto, seja lendo mais sobre a técnica e o pensamento de um artista, sobre a época em que ele viveu ou até sobre fatos curiosos de sua personalidade. Será que o público não adoraria saber o que passou pela cabeça de Cildo Meireles ao criar o Zero Dollar? Isso poderia ser feito, por exemplo (mas não só), por meio digital: tablets, telas touch e apps para as exposições temporárias seriam apenas algumas formas de ampliar o conteúdo, despertar o interesse de diferentes faixas etárias e grupos sociais e promover uma maior interação com o público – outra coisa que o MAM não vem explorando em sua programação.
Se a exiguidade de conteúdos disponíveis nas exposições do MAM nos remete ao distanciamento entre o museu e seu público, as etiquetas só reforçam esse fato. Em um país onde as estatísticas não param de alertar para o fato de que a população está envelhecendo, etiquetar as obras com letra de corpo pequeno é não se importar com a transmissão da informação mais básica (lembro-me de mostras em que as etiquetas, em letra muito pequena, foram aplicadas diretamente no chão, e dava pena ver as pessoas mais velhas se curvando ou, pior, desistindo de ler).
A expografia que se repete há décadas, a falta de conhecimento, diálogo e relacionamento com o público, a dificuldade de ressignificar as coleções, de provocar questionamentos e de, assim, passar a ocupar um espaço real e relevante na vida das pessoas: nada disso é prerrogativa do MAM. Há inúmeros museus nessa situação, no Brasil e em tantos outros países – mesmo naqueles do "primeiro mundo".
Postei um resumo desta crítica nas redes sociais e duas respostas surgiram de imediato: a culpa seria dos curadores e da falta de dinheiro. Não concordo (quem dera o problema fosse tão simples!) e deixo o assunto propositalmente em aberto, esperando que este artigo possa gerar novas respostas e debates.
Continua (09/02)
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