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Sejam Bem-vindos!!! Este é um espaço dedicado a arte e aos seus (futuros) admiradores. Ele é uma tentativa de despertar em seus visitantes o gosto pelo assunto. Aqui, poderão ser encontradas indicações de sites, livros e filmes de Artes Visuais, imagens de artistas, alem do meu processo de trabalho. É o meu cantinho da expressão. Espero que sua estadia seja bastante agradável e proveitosa.
Este Blog é feito para voces e por voces pois muitas das postagens aqui presentes foram reproduzidas da internet. Alguma das vezes posso fazer comentarios que de maneira parecem ofensivos porem nao é minha intençao, sendo assim, me desculpem. Se sua postagem foi parar aqui é porque ela interessa a mim e ao blog e tento focar os pontos mais interessantes. A participaçao dos autores e dos leitores é muito importante para mim nestes casos para nao desmerecer o texto nem acabar distorcendo o assunto

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

POLÍTICOS VÊEM A CULTURA COMO UMA SENHORA DOENTE

Como este blog fala sobre arte e cultura, nada melhor que colocar um artigo sobre este assunto

Políticos vêem a cultura como uma senhora doente, por Arnaldo Jabour

Os homens do poder no Brasil têm uma visão ultrapassada da cultura brasileira.
A cultura é uma deusa abstrata, uma senhora velha e triste, de camisola grega, que mora num museu, perto das salas das múmias. É assim que a cultura é vista pela maioria dos políticos brasileiros, por deputados metafísicos, por senadores-literatos, e por simples burocratas de todos os escalões. É difícil mexer suas cabeças. A história do cinema brasileiro, por exemplo, tem sido um delírio que faria Kafka reescrever “O processo”. Temíamos as serpentes e esquecemos das minhocas. Achávamos que o “imperialismo” destruiria o cinema nacional, mas quem nos destruiu foi um pequeno cineasta fracassado: Ipojuca Pontes e seu rancor.
Assim, lutávamos contra gigantes e os anõezinhos deram as rasteiras. No país, os psicopatas light são mais perigosos que os grandes canalhas. Vejam os anões do orçamento ou os pequenos relatores das reformas.
Que pensam os políticos e muitos ministros de áreas técnicas sobre a criação brasileira? Quase todos têm uma visão portuguesa de que a cultura precisa de caridade ou ajuda. Ninguém pensa em cultura no Brasil como um ser vivo. E a idéia de ajuda leva ao desejo de intromissão e controle.
Vejamos algumas nuances.
1 – Políticos figurativos: são inteligentes e liberais até a hora em que se fala de cultura. Aí, perdem o rumo, entram em angústia. Eles detestam a coisa fluida da arte. Odeiam o abstrato. Um quadro de Antônio Dias, por exemplo, provoca pânico. Querem pegar o objeto, carimbar vias, exigir certidões, clareza. Eles têm horror da “forma das coisas desconhecidas” como diria ShaKespeare. Querem a figura. Há muitos no PT, todos do PC do B, muitos no PFL e PSDB. Político brasileiro é acadêmico e figurativo.
2 – Políticos anti-utópicos: Ninguém entende que a cultura tem de ser fecundada e não financiada. Os políticos tinham de instrumentos e órgãos que buscassem se extinguir, por desnecessários. Como pais que ensinam os filhos a serem independentes. Mas não conseguem. São aliados dos burocratas dos guichês. O guichê é a dor do artista dependente, a proteção do burocrata e a lojinha de favores de políticos. Através do guichê, passam todos os rituais do clientelismo cordial. O guichê é a portinhola do fisiologismo.
3 – Kafkas e macartistas: Surgiram depois da onda das CPIs. Misturando fobia e correção, transformam todo projeto numa impossibilidade. Só criam decretos em forma de labirinto, com tantas garantias contra desvios, que qualquer lei perde sua função de estímulo. A Lei Rouanet foi assim. A gestão atual do ministério conseguiu melhorá-la, mas, quando foi sancionada, era impossível de ser aplicada. Um burocrata me disse, na época: “Se fosse fácil de aplicar, não tinha graça…”. A lei vira um fim em si. A arte passa a existir para garantir a dificuldade da lei.
Na cabeça do político médio, o artista é uma espécie de marginal que tem de ser vigiado em seu sórdido desejo de criar. O ideal para eles seria um cinema sem filmes, um balé sem danças, um teatro sem peças. De onde vem esta idéia, num país de corruptos, de que o pobre diabo do artista é um assaltante? Dos funâmbulos portugueses do século XV?
4 – Esquerdistas da cultura (Os vingadores): Estes políticos acham que “amam” o povo, e, portanto, concluem que não pode haver cultura porque o povo passa fome. Slogan “Se não há pão, para que arte?”. Neste raciocínio, talvez o fim do balé Corpo acabasse com a miséria no Vale do Jequitinhonha. Gritam de fronte alta: “O Piauí sofre, mas, em compensação, o Jabor não filma mais!”.
5 – Esquerdista da cultura tipo B (a forma): São seletivos em termos de arte. Toda complexidade é “alienação”. São patrulheiros estéticos do formalismo. Para o povo, só as coisas simples, claras. Eles me lembram uma milionária carioca que redecorou a casa toda e botou Picassos na sala e Vitalinos no quarto das empregadas.
6 – Políticos machistas: Acham que arte é coisa de viado. Dizem que esta frase é de Mário Covas.
7 – Empresários sem poesia: Jamais aplicam em cultura, apesar das leis novas. Acham que cultura é o vaso de Murano que a bicha decoradora mandou a mulher dele comprar para a casa pós-moderna do Morumbi. Falam com orgulho, mostrando o vaso ao amigo da Bolsa: “Quer ver o que é arte? Arte é isso!”.
8 – Tecnocratas “Hamlet”: Vivem do medo e da indecisão. Nunca têm coragem de decidir em seu nível. Sempre esperam a instância superior que espera a instância superior e assim por diante. Para eles, nada anda. Odeiam a simplicidade. Se o mundo fosse simples, eles perderiam o emprego. Na época da Embrafilme, eles viviam da fome dos cineastas. Era preciso que houvesse cineastas carentes para que houvesse funcionários. Eles nos queriam vivos, mas em agonia, para que não perdessem os empregos. A Embrafilme gerou uma fornada de cineastas infantilizados e de produtores-despachantes que não conheciam o mundo real do mercado.
9 – Políticos críticos (de cinema ou outra arte): Eles têm gosto próprio. Alguns, por exemplo, só gostam de filmes de ação. Senadores e deputados berram: “Rambo é legal; mas este negócio de filme da arte tem de acabar!”.
10 – Políticos de fino gosto: São poucos, mas existem. Só gostam de filme estrangeiro Adoram Bergman, filmes búlgaros e iranianos. Sabem tudo sobre Tarantino ou Almodóvar. “Filme brasileiro para quê? Já tem novela… “Se os críticos esquerdistas da cultura são típicos dos ministérios econômicos, o burocrata fino é típico do Itamaraty. Cultura para eles, só Ming ou Gobelins. Toleram, no máximo, um Aleijadinho.
11 – Os regionais da cultura: Arte e criação só de micro-regiões. É o pessoal do bumba-meu-boi contra a arte urbana. A cultura tem de ser “descentralizada” (adoram esta palavra) e ser bem pobrezinha e precária para existir como metáfora de nossa miséria mambembe. Slogan preferido: Abaixo Mallarmé! Viva o Maculelê!”.
12 – Afilhados da arte: Sempre que algum deputado ou senador tem de empregar o filho incompetente de algum compadre, grita. “Ele sabe fazer o quê? Nada? Então manda para a cultura!”. Cria-se uma geração de afilhados sem rumo que atravancam as fundações artísticas e as secretarias de cultura dos estados. Cabide também é cultura. “Que que o senhor é?”. “Bem, eu era assassino em Maceió. Agora sou chefe do Departamento de Literatura e Semiologia”.
13 – Literatos engajados: Para estes políticos, a arte é um ornamento que enfeita o triunfo político. Muitos vão ser escritores ou poetas para construir um prestígio que facilite eleições ou postos bem pagos. Para eles, a literatura engajada é aquela que ajuda a descolar bons postos no exterior. Escrevem muito. Gostam de nossas lendas e folclore. Conhecem como poucos a beleza da vida rude de nossos homens do interior, mas vivem em postos de Paris. Este tipo de literatura engajada na política foi inventada no Maranhão.
14 – Juristas implacáveis: Homens em geral muito velhos ou mulheres muito louras e com muito laquê e muito batom. Chamam-se em geral dr. Bevilacqua ou d. Margareth. Comem de marmita e dormem no almoxarifado. Estão nos ministérios há 40 anos e falam muito em Gustavo Capanema. Para eles, nada pode. Tudo é ilegal. Os ministros penam em suas mãos. Destroem qualquer lei coma técnica da regulamentação. Exemplo. A Lei da Cultura de S. Paulo, que Ricardo Othake criou, foi a melhor já feita. No Governo de Covas, foi engavetada por motivos misteriosos. Nunca mais se falou disso.
É isso aí. No Brasil, o Poder pensa que a cultura é uma senhora doente que tem de ser protegida para não morrer.
   Nos EUA, a cultura é uma adolescente criativa que tem de ser estimulada a viver.
Precisamos de um banho americano nesta cultura portuguesa.
Arnaldo Jabor – Segundo Caderno – O Globo 09.01.1996

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